Corona-Vírus e Alterações Legislativas

O advento da pandemia da COVID-19 tem alterado a vida de trabalhadores e o funcionamento das empresas e inúmeras mudanças legislativas têm sido implantadas no alegado objetivo de conciliar as dificuldades econômicas e a necessidade de manutenção de emprego.

Ocorre que a pandemia não justifica alterações (e muito menos abusos) promovidos fora dos limites legais e contratuais, sendo importante que tais limites sejam conhecidos e respeitados pelos envolvidos e que a responsabilização pelo descumprimento seja feita perante o Poder Judiciário.

O escritório Thaís Rossa vem auxiliando trabalhadores e empresas na compreensão dos termos na nova legislação e tem atuado judicialmente para promover a responsabilização por constantes descumprimentos.

Dentre as inúmeras alterações legislativas que afetam os contratos de trabalho, destacam-se as seguintes:

 

MEDIDA PROVISÓRIA  927/20

Assinada em 22/03/2020 e publicada em edição extraordinária do Diário Oficial, a MP 927/20 ganhou vigência imediata e suas disposições especiais perdurariam enquanto vigorasse o estado de calamidade pública, inicialmente reconhecido pelo Decreto Legislativo n. 6/20, com efeitos até 31/12/2020.  Ocorre que a prorrogação da validade por período superior a 120 dias dependeria de votação e aprovação do texto pelas casas do Congresso Nacional e o Senado Federal não promoveu a votação da Medida Provisória 927/20, fazendo com que o texto perdesse sua vigência em 19/07/2020.

Os atos praticados na vigência da MP 927/2020 – desde que respeitadas as prescrições da norma – são válidos, em princípio.

Quanto ao teor da norma em si, o artigo 3º da MP 927/20 permite que, para enfrentamento dos efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade pública e para preservação do emprego e da renda, as empresas poderão adotar as seguintes medidas:

 

I – o teletrabalho;

Segundo a Reforma Trabalhista aprovada no governo de Michel Temer (Lei n. 13.467/2017), o trabalho remoto ou em home office, já é permitido desde que exista acordo entre o empregador e o empregado e que a alteração conste no contrato de trabalho.  Presumida, portanto, a necessidade de um acordo escrito.

Já a MP 927/20 permite que o empregador unilateralmente desloque o empregado para teletrabalho ou home office, independentemente de alteração do contrato de trabalho, desde exista comunicação por escrito com antecedência mínima de 48h.

Quanto à responsabilidade e ao reembolso de despesas com equipamentos e infraestrutura no teletrabalho, também existe a necessidade de previsão em contrato escrito, a ser assinado no prazo de 30 dias contados da mudança do regime.

Outra inovação trazida pela MP 927/20 inova é a permissão de que regime de home office para estagiários e aprendizes.

 

II – a antecipação de férias individuais;

As férias do empregado podem ser antecipadas, mesmo que o período aquisitivo não esteja completo (12 meses de trabalho), mediante comunicação escrita com antecedência mínima de 48h. Também existe a possibilidade de antecipação das férias anos seguintes, desde que exista acordo entre as partes a esse respeito.

O pagamento das férias pode ser feito até o 5º dia útil do mês seguinte ao gozo das férias e o adicional de 1/3 das férias pode ser pago até a data do pagamento do 13º salário.

A concessão das férias aos trabalhadores que integram grupo de risco da covid-19 deve ser priorizada. Já os trabalhadores da área da saúde ou que exercem atividades essenciais podem ter suas férias suspensas durante o período de calamidade pública.

 

III – a concessão de férias coletivas;

A concessão de férias coletivas é permitida desde que os trabalhadores sejam comunicados com antecedência mínima de 48h, não sendo necessária a comunicação ao Ministério da Economia ou aos sindicatos correspondentes, como se prevê na CLT.

Além disso, não se aplicam as regras da CLT de limite mínimo de dias corridos ou limites máximos de períodos anuais para a concessão das férias coletivas.

 

IV – o aproveitamento e a antecipação de feriados;

Desde que comunique o empregado com antecedência mínima de 48h, o empregador pode antecipar o gozo do empregado de feriados não religiosos. Os feriados religiosos também podem ser antecipados desde que haja acordo escrito entre as partes.

 

V – o banco de horas;

A validade do banco de horas regulado pela CLT demanda a existência de acordo individual ou coletivo, a depender do tempo necessário para a compensação.

Já a MP 927/20, em caráter de exceção, possibilita a manutenção de banco de horas sem que haja acordo entre as partes, para compensação até 18 meses da data do encerramento do estado de calamidade.

 

VI – a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;

Pela redação da MP 927/20 houve a suspensão da realização obrigatória de exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, que deverão ser realizados no prazo de até 60 dias após decretado o fim do estado de calamidade pública. A previsão não exclui a obrigatoriedade dos exames demissionais.

Também foram suspensos os treinamentos periódicos previstos por normas de saúde e segurança do trabalho, que deverão ser realizados no prazo de 90 dias após o fim do estado de calamidade pública.

 

VII – o direcionamento do trabalhador para qualificação; e

Referido artigo da medida provisória foi revogado no mesmo dia de sua publicação, ante as severas críticas feitas por diversos setores da sociedade.

 

VIII – o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.

Houve a suspensão do pagamento do FGTS pelo empregador nos meses de março, abril e maio deste ano e adiado para o mês de julho, podendo ser parcelado em até 6 vezes sem incidência de atualização, multa e encargos, desde que declarado até o dia 20 de junho de 2020.

Demais alterações

As demais medidas previstas na MP 927/20 podem ser consultadas em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/mpv927.htm

MEDIDA PROVISÓRIA  936/20 (convertida em Lei)

Ainda no afirmado objetivo de preservar empregos e renda, a Medida Provisória 936/20 foi publicada em 1º de abril de 2020, trazendo disposições relativas ao pagamento do benefício emergencial, à redução proporcional de jornada e salário e à suspensão temporária do contrato de trabalho. Referida MP foi convertida na Lei n. 14.020, de 6 de julho de 2020

 

Redução de jornada e salário

A MP 936/20 possibilita às empresas a redução de jornada e salário, estabelecendo os limites de 25%, 50% ou 70%, pelo prazo de até 90 dias, com comunicação ao empregado com antecedência de 2 dias.

O restabelecimento das condições normais pode ocorrer no caso de cessação do estado de calamidade; da data estabelecida no acordo ou da data que o empregador comunicar o empregado no caso de antecipar o fim da redução.

A redução de 25% poderá ser ajustada diretamente com os empregados, por meio de acordo individual. Já os percentuais de 50% e 70% de redução salarial e de jornada, a redução poderá ser negociada diretamente com os empregados que tenham salário de até R$ 3.135,00 (três salários mínimos) ou com os empregados que a CLT considera hiperssuficientes (que tenham diploma de curso superior e possuam salário de R$ 12.202,12 ou mais).

Para redução de salário dos trabalhadores que ganham entre R$ 3.135,00 e R$ 12.202,12, será necessária a intervenção do sindicato. Igualmente deverá ocorrer a intervenção sindical para a redução de salário em outros percentuais, tais como 10%, 15%, 40% 60% entre outros, pela celebração de acordo ou convenção coletiva de trabalho.

A MP 936/20 também reduziu formalidades da negociação coletiva (art. 17, II e III), permitindo a utilização de meios eletrônicos para atendimento de diversos requisitos formais previstos na CLT, inclusive para convocação, deliberação, decisão, formalização e publicidade de convenção ou de acordo coletivo de trabalho, e seus prazos previstos na CLT (Título VI) são reduzidos pela metade.

Suspensão do contrato de trabalho

A Medida Provisória 936/2020 permite a suspensão dos contratos de trabalho pelo prazo máximo de 60 dias, com comunicação ao empregado com antecedência de 2 dias. Há também a possibilidade de suspensão do contrato e posterior redução da jornada de modo sucessivo, desde que a soma das duas medidas não ultrapasse 90 dias.

Para empresas que tem faturamento abaixo de 4,8 milhões a União pagará o equivalente a 100% do seguro desemprego a que o empregado teria direito; e, para faturamento superior a 4,8 milhões, a União pagará o equivalente a 70% do seguro desemprego a que o empregado teria direito e a empresa o restante.

Se o empregado mantiver atividades de trabalho no período de suspensão, mesmo que remotamente, estará descaracterizada a suspensão e o empregador estará sujeito ao pagamento da remuneração e encargos, das penalidades previstas em lei e de sanções eventualmente previstas em convenção ou acordo coletivo.

Segundo o art. 10 da MP 936/20, os empregados que tiveram seus contratos de trabalho suspensos ou redução da jornada/remuneração, mediante recebimento de benefício emergencial, possuem garantia de emprego no período da redução/suspensão e mais período idêntico após retorno ao trabalho. Entretanto, podem ser despedidos com o pagamento das indenizações previstas no parágrafo 1° do art. 10 da MP 936/20, além do pedido de demissão e da despedida por justa causa

Quanto aos encargos da folha de pagamento não houve desoneração propriamente dita, porém a incidência ocorrerá sobre o montante de salário já reduzido, o que permitirá economia, ainda que provisória.

Benefício emergencial 

Trata-se de valor que União pagará ao empregado no caso de redução proporcional da jornada de trabalho e salário e ou em caso de suspensão temporária do contrato de trabalho. Citado benefício tem como base de cálculo o valor mensal do seguro desemprego a que o trabalhador teria direito e seu montante dependerá do modo de alteração realizada no contrato de trabalho, sendo certo que o valor pago pela União não ultrapassará o teto do seguro desemprego, atualmente de R$1.813,00 (um mil e oitocentos e treze reais).

 O empregado tem direito ao benefício a partir da data da redução da jornada ou suspensão do contrato de trabalho e o empregador deve comunicar a celebração do acordo no prazo de 10 dias ao Ministério da Economia, contados da data da celebração do acordo, sob pena de ser responsabilizado pelo pagamento da remuneração anterior à redução ou suspensão, até que a informação seja prestada.

Não há carência para recebimento do benefício pelo empregado, que será pago independente do cumprimento de qualquer período aquisitivo, tempo de vínculo e número de salários recebidos.

Ocupantes de cargo ou emprego público, cargo em comissão e titular de mandato eletivo não têm direito a este benefício, assim como os empregados que estiverem em gozo de benefício de prestação continuada, de seguro desemprego e recebendo a bolsa qualificação profissional. Já o empregado que possui mais de um vínculo formal poderá receber cumulativamente um benefício em razão de cada um dos vínculos com redução de salário ou suspensão.

Os trabalhadores que possuem contratos intermitentes, nos termos do art. 18, não farão jus ao benefício previsto na MP 936/20, pois terão direito ao benefício de R$600,00 (seiscentos reais). Igualmente a existência de mais de um contrato intermitente não gera direito a mais de um benefício mensal.

Demais alterações

As demais medidas previstas na MP 927/20, já convertida em Lei, podem ser consultadas em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Lei/L14020.htm

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